EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR
JUIZ DE DIREITO DA SEGUNDA VARA DA COMARCA DE QUIRINOPOLIS.
O MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, por intermédio da 2º Promotora de Justiça ao final
subscrita, com fundamento no artigo 127, caput, c.c. o artigo 129, inciso III,
da Constituição Federal, c.c. o artigo 25, inciso IV, alínea “a”, da Lei
Orgânica Federal nº 8.625/93, c.c. o artigo 103, inciso VIII, da Lei Orgânica
Estadual nº 734/93, c.c. os artigos 5º, caput, e 12, da Lei Federal nº
7.347/85, sob o rito ordinário, previsto nos artigos 282 e seguintes, do Código
de Processo Civil, vem propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
em face das instituições
bancárias: BRADESCO S/A, instituição financeira privada, constituída sob a
forma de sociedade anônima, inscrita no CNPJ 60.746.948.0001-12,
, situado à Av. Brasil 168, Centro; BANCO
DO BRASIL S/A, instituição financeira de economia mista, constituída sob a
forma de sociedade anônima, inscrita no CNPJ 00.000.000/4369-92, cuja agência
encontra-se situada na Av. Brasil n. 170; BANCO ITAU S/A, instituição
financeira privada, constituída sob a forma de sociedade anônima, inscrita no
CNPJ nº 60.701.190/0001-04, cuja agência
encontra-se situada na Av. Brasil n. 146; BANCO SICREDI S/A, instituição
financeira privada, constituída sob a forma de sociedade anônima, inscrita no
CNPJ 01.181.521/0001-55, cuja agência encontra-se situada na Av. Joaquim
Timóteo de Paula, 124 – Centro
; e, BANCO SICOOB S/A, instituição financeira privada,
constituída sob a forma de sociedade anônima, inscrita no CNPJ 04.310.638.0001-80,
localizado na Av. Joaquim Timóteo
de Paula, 145, Centro
pelos
seguintes fatos e fundamentos:
DOS FATOS
Instaurou-se no âmbito da 2º
promotoria de justiça de Quirinópolis, com atribuições para a matéria relativa
ao consumidor, o procedimento administrativo nº 201300328990, para apurar
denúncia de que agências bancárias de Quirinópolis, não vem cumprindo a Lei Municipal
nº 2260, de 12/05/1999, que obriga as agências bancárias a efetuar o
atendimento dos usuários em período máximo de até 15 minutos, em dias normais.
Requisitadas
informações do Procon, órgão fiscalizador, restou apurado que várias agências
bancárias do Município, vêm descumprindo a citada Lei Municipal, conforme notificação
anexo ao procedimento.
O Oficial de
Promotoria diligenciou em todas as agências bancárias para verificar o
cumprimento da legislação, tendo constatado que somente as requeridas não
cumprem a lei municipal.
Da leitura do
referido relatório, nota-se que as requeridas excederam, por período
considerável e inadmissível, o tempo de atendimento, sendo que em determinados
dias, o tempo de espera chegou a astronômicos 60 (sessenta) minutos.
Conforme
relatório apresentado pelo oficial de promotoria contatou-se o seguinte tempo
de espera nas filas das requeridas, em dias normais de atendimento que deveria
ser no máximo 15 minutos:
60 minutos, no Banco
Bradesco (fls.21);
46 minutos, no Banco Sicredi
(fls.32);
20 minutos, no Banco do
Brasil (fls. 19)
40 minutos, no Banco Itaú;
Desta forma, ficou
evidenciado pelos documentos que instruem o procedimento que, nas datas
mencionadas, as requeridas demoraram a atender seus clientes e usuários, por
período bem superior ao estabelecido na Lei Municipal, chegando ao absurdo de
registrar uma hora de demora na fila, o que representa grave desrespeito aos
consumidores e à população em geral.
Como já anotado,
o artigo 2º, da Lei Municipal nº 2260/99, estipula, como tempo razoável para
atendimento, o máximo de 15 (quinze) minutos, sob pena de constrangimento
indevido do usuário.
Destarte, ainda
que repetidas pesquisas, veiculadas pela mídia nacional, revelem o fato notório
de que os bancos detêm os mais expressivos marcos de crescimento econômico
(lucro líquido), sem que a crise que assola o país venha também a atingi-los,
paradoxalmente não vem demonstrando preocupação em respeitar os direitos do
consumidor.
Com efeito,
basta adentrar qualquer agência bancária deste município para verificar que
pequenas medidas já seriam suficientes para avançar significativamente na forma
de prestação dos serviços bancários autorizados pelo Poder Público, poupando os
consumidores (usuários, clientes ou não) de um modo geral de toda uma série de
aborrecimentos e perda de tempo, provocados pelo mau gerenciamento das
agências.
A formação de
longas filas de usuários à espera de atendimento que, muito frequentemente,
deve-se à falta de pessoal suficiente designado para prestá-lo, ou a criação de
outro mecanismo que acabe com as longas filas de espera, chega a causar
indignação na população local, sendo corriqueira, conforme é de conhecimento
público, a prática das requeridas de desviar os bancários designados para o
atendimento para a execução de outras funções administrativas, desfalcando,
desta forma, a prestação do serviço de atendimento ao consumidor do número
suficiente de funcionários para torná-lo rápido e eficiente.
Assim sendo, as
agências não vem cumprindo a referida Lei Municipal, que se refere ao limite de
atendimento destinado a cada cliente, desconsiderando os direitos mais
basilares dos usuários e consumidores em geral.
Estes, em síntese
necessária, são os fatos.
DA
LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
A ação civil pública surgiu
em nosso ordenamento jurídico com o advento da Lei Federal 7.347, de 24 de
julho de 1.985, destinada à reparação e proteção dos interesses difusos, assim
compreendidos os metaindividuais, pertinentes a titulares não passíveis de
determinação.
Posteriormente,
com a promulgação da Constituição Federal de 1.988, estendeu-se o cabimento da
ação civil pública também para a tutela de interesses coletivos, que,
igualmente, transindividuais, se distinguem daqueles já mencionados apenas em
razão da possibilidade de identificação do grupo.
Na hipótese
presente, a legitimação do Ministério Público decorre justamente no artigo 129,
inciso III, da Lei Maior (são funções institucionais do Ministério Público:
promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos).
Depois, com a
edição do Código do Consumidor (Lei Federal nº 8.078, de 11 de setembro de
1.990), o legislador desceu à conceituação:
“Artigo 81: Parágrafo único:
A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos
difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de
natureza indivisível de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas
por circunstâncias de fato”
Incumbe, também,
ao Ministério Público, a legitimação para a defesa coletiva dos interesses ou
direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos do consumidor (artigo 82,
inciso I, CDC).
Os traços comuns
a ambas as categorias apontadas são a “transindividualidade” e a
“indivisibilidade” dos interesses de que tratam.
Os interesses
dos consumidores afetados pela demora no tempo de espera no Banco são difusos
porque, não existe qualquer vínculo jurídico a ligar seus titulares entre si ou
com a parte contrária, sendo, consequentemente, os titulares dos interesses
difusos indetermináveis, estando unidos apenas por circunstâncias de fato (como
a de consumirem o mesmo produto, habitarem a mesma região, participarem dos
mesmos empreendimentos, etc.
Assim, a
presente demanda visa a assegurar a proteção de direitos difusos de consumidores,
que estão sofrendo com o tempo de espera na fila do Banco.Tais consumidores
estão dispersos na sociedade, sendo, portanto, indetermináveis, e ligados por
uma relação de fato, determinando que o interesse tratado é difuso.
DO DIREITO
A presente ação tem como
objetivo a defesa do direito difuso do cidadão usuário, bem como dos
consumidores em geral, fazendo com que as agências bancárias se adaptem às
regras previstas na Lei Municipal nº 2260/99, que, em seu artigo 2º, obriga as agências bancárias, no âmbito do
município, a atender seus consumidores no prazo de 15 minutos, para que
atendimento seja efetuado em tempo razoável, ou seja, em conformidade com a
Lei, fazendo uso de sistema de senha, de modo a preservar a dignidade dos
usuários.
No entanto, essa
falta de adequação dos requeridos, no sentido de atender seus usuários dentro
do prazo máximo de quinze (15) minutos, além de representar desrespeito à Lei
Municipal, representa, também, total desrespeito ao sentimento de dignidade da
comunidade (povo), trazendo a ela enormes prejuízos, tanto materiais como
morais, tendo em vista a demora do atendimento.
As instituições
bancárias, como é notório, auferem grandes lucros, principalmente pela política
de juros altos instituídas pelo governo, razão pela qual as Agências Bancárias
deveriam respeitar mais seus clientes, em consideração justamente ao grande
lucro que deles retiram.
Ao disciplinar o
tema, por meio da Lei Municipal nº 2260/99, impondo aos bancos o ônus de
oferecer um serviço digno, com o objetivo de coibir filas intermináveis,
determinando o tempo máximo de permanência dos cidadãos nas filas das agências
bancárias, visou-se tão somente a diminuir o desconforto, o prejuízo e o
constrangimento físico e emocional provocado pelas longas esperas.
Tal
disciplinamento não implica em interferência no sistema financeiro, nem tão pouco,
no propalado funcionamento unificado da rede bancária.
Hely Lopes
Meirelles, com efeito, equipara os dispositivos legais em exame limitação
administrativa que o Poder Público impõe às instituições bancárias para
humanizar o serviço (de utilidade pública) bancário, como forma de promoção da
paz social, dentro de uma realidade local'. Para este autor:
“As limitações
administrativas representam modalidades de expressão da supremacia geral que o
Estado exerce sobre as pessoas e coisas existentes no seu território,
decorrendo do condicionamento da propriedade privada e das atividades
individuais ao bem estar da comunidade”
Acrescenta, aliás, que a
competência exclusiva da União para legislar sobre o funcionamento e
fiscalização da rede bancária “não torna os bancos imunes à ação das outras
esferas de governo (estados federados e municípios), no tocante às suas
competências constitucionalmente asseguradas.”
O Superior Tribunal de
Justiça, no Recurso Especial nº 467.451, a respeito já decidiu:
ADMINISTRATIVO‑ AGÊNCIA BANCÁRIA‑FUNCIONAMENTO‑ HORÁRIO DE FUNCIONANENTO AO
PÚBLICO. 1. Dentro da evolução da jurisprudência desta Turma, com a orientação
dada pelo STF, têm-se entendido que pode o Município estabelecer o tempo de
atendimento ao público, a partir da identificação do horário da retirada da
senha e de efetivo atendimento. 2. Por interferência do PROCON, os Municípios
têm editado leis diversas no sentido de regulamentar o prazo de atendimento. 3.
Recurso especial conhecido, mas improvido (Recurso Especial nº 467.451 ‑ Santa Catarina. 2ª Turrna,
Relatora Ministra Eliana Calmon, j. 18/05/03, DJ 16/08/04, p. 188).
Em nível superior, o STJ tem
decidido que não há que falar de inconstitucionalidade da normatização
municipal do funcionamento das agências e estabelecimentos financeiros (REsp.259.964-SP)
Destaca-se que a
legislação municipal não está dispondo sobre a organização, o funcionamento e
as atribuições de instituição financeira. Esta está tão-somente dispondo sobre
a adequação dos estabelecimentos bancários para melhor atendimento da
coletividade. Ademais, compete aos Municípios, nos termos do art. 30, I, CF,
legislar sobre assuntos de interesse local. É, sem dúvida, assunto de interesse
local a disciplina do comércio, de qualquer natureza, e da prestação de
serviços.
DA VIOLAÇÃO CONCOMITANTE A PRECEITOS ESPECÍFICOS DO CDC
O Código de
Defesa do Consumidor, por determinação expressa, é aplicável ao serviço
bancário, uma vez que as entidades rés podem ser consideradas fornecedoras, ex
vi do art. 3º, § 2º, de referido Diploma legal, que dispõe:
“Art. 3º – Fornecedor é toda
pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem
como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção,
montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,
distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”
(...)
§ 2º – Serviço é qualquer
atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as
de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as
decorrentes das relações de caráter trabalhista.”
José Reinaldo da Lima Lopes,
neste aspecto, esclarecendo a razão de ser de referido dispositivo, acentua
que:
“É fora de dúvida que os
serviços financeiros, bancários e securitários encontram-se sob as regras do
Código de Defesa do Consumidor. Não só existe disposição expressa na Lei n.º
8078/90 sobre o assunto (art. 3º, § 2º), como a história da defesa do
consumidor o confirma, quando verificamos que a proteção aos tomadores de
crédito ao consumo foi das primeiras a ser criada. De outro lado, nas relações
das instituições financeiras com seus “clientes” podem-se ver duas categorias
de agentes: os tomadores de empréstimos (mutuários) e os investidores
(depositantes).” (In Consumidor e Sistema Financeiro, artigo para a revista
Direito do Consumidor, n.º 19)
Para Nelson Nery Júnior, por outro lado:
“Caracterizam-se os serviços
bancários como relações de consumo em decorrência de quatro circunstâncias, a
saber: a) por serem remunerados; b) por serem oferecidos de modo amplo e geral,
despersonalizado; c) por serem vulneráveis os tomadores de tais serviços, na
nomenclatura própria do CDC; d) pela habitualidade e profissionalismo na suai
prestação.” (In Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, p. 470)”.
O STJ, já se manifestou
sobre a matéria e, pelo voto condutor da Ministra Nancy Andrighi, decidiu que
“Da aplicabilidade do CDC às
instituições financeiras – no que respeita à violação aos arts. 2º e 3º do CDC,
deve-se mencionar que a aplicabilidade do CDC às instituições financeiras, nos
termos do v. acórdão recorrido, encontra-se em consonância com a jurisprudência
dominante deste C. STJ, verbis:
CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. BANCOS. CLÁUSULA PENAL; LIMITAÇÃO EM 10 %. 1.- Os bancos, como
prestadores de serviços especialmente contemplados no artigo 3º, parágrafo
segundo, estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor. A
circunstância de o usuário dispor do bem recebido através de operação bancária,
transferindo-o a terceiros, em pagamento de outros bens ou serviços, não o
descaracteriza como consumidor final dos serviços prestados pelo banco. (REsp.
n. 57974/RS, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, unânime, DJ
29/05/95).
A prestação de
serviços bancários, com um sistema insuficiente para permitir o atendimento ao
consumidor, de forma rápida e eficiente, provoca riscos à saúde dos
consumidores/usuários, pessoas as quais as requeridas, na qualidade de
fornecedoras daqueles serviços, têm o dever de proteger. Não é outra a dicção
do art. 6º, inciso I do CDC:
Art. 6º – São direitos
básicos do consumidor:
I – a proteção da vida,
saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de
produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
A preocupação do legislador,
no que pertine a saúde do consumidor, é tão relevante que aparece, ainda, no
art. 8º do mesmo Diploma legal, que dispõe:
“Art. 8º – Os produtos e
serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou à
segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em
decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em
qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu
respeito.”
Por óbvio, ao
submeter o consumidor a filas intermináveis, que implicam espera que ultrapasse
a intermináveis sessenta (60) minutos, conforme relatório do oficial de
promotoria as agências impõem aos usuários dos serviços bancários, desconforto,
prejuízo e constrangimento físico e emocional, que deveriam, a teor do
dispositivo referido acima, evitar.
Isto se repete,
com maior gravidade, quanto ao consumidor em desvantagem (idosos, gestantes e
deficientes), os quais, apesar de não gozarem de estado de saúde que recomende
que permaneçam em pé por longos períodos, por vezes, são obrigados a fazê-lo à
falta de assentos de onde pudessem aguardar sentados pela prestação do serviço
bancário.
Outro aspecto de
referida lei, que também encontra guarida em disposição do CDC, é o que se
refere à afixação da escala de horário dos caixas, em local de fácil
visualização, de modo a permitir que o consumidor fiscalize se todos os
empregados designados para atender ao público se encontram de fato disponíveis
para fazê-lo.
Assim é que, como preconiza
o mesmo art. 6º, inciso III, da Lei Consumerista, é direito básico do
consumidor:
III – a informação adequada
e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de
quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os
riscos que apresentam;
Trata-se do dever de
informar bem o público consumidor sobre característica importante do serviço,
de modo a que lhe seja possível saber exatamente o que esperar dele ou, aliás,
se está prestado com a devida consideração a seu direito, por número de
trabalhadores (bancários) condizentes com a demanda de serviço, uma vez que é
notória a prática dos bancos de evitar contratações, fazendo com que o serviço
se acumule absurdamente nas mãos de poucos funcionários, muito dos quais são
apenas estagiários, recebendo baixos salários, apesar dos lucros astronômicos
das sobreditas instituições.
DO DANO MORAL COLETIVO
Necessário se faz reconhecer
que o serviço ofertado ao consumidor possui vício de qualidade, na medida que
expõe o consumidor a situação de vexame, constrangendo-o em razão da prática
abusiva.
Prescreve o art. 6º, inciso
VII, do codex citado:
"Art. 6º - São direitos
básicos do consumidor:
Omissis...
VI - a efetiva prevenção e
reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
A segurança e a tranquilidade
de todos os indivíduos, assim como o sentimento de cidadania, é bruscamente
atingido quando o patrimônio moral de uma coletividade é lesado, sem que haja
qualquer direito à reparação desta lesão. No caso em tela, ficou evidenciado o
descaso das agências bancárias, que deixam de cumprir a legislação municipal,
ainda que repetidas pesquisas veiculadas pela mídia nacional revelem o fato
notório de que as requeridas detêm os mais expressivos marcos de crescimento
econômico, auferindo lucros absurdos, sem respeitar, contraditoriamente, os
direitos do consumidor.
Define-se
patrimônio moral, nas palavras de Wilson Melo da Silva, como “patrimônio ideal,
em contraposição ao material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível
de valor econômico.”
Como consequência
desta lesão a um bem juridicamente tutelado, está a necessidade de indenizar,
entendendo-se por indenização a reparação do dano causado integralmente, sendo
que, no caso de impossibilidade dessa forma, vislumbra-se a compensação em
forma de pagamento de uma indenização em dinheiro.
Verifica-se,
assim, que o Código do Consumidor garantiu como direito básico do consumidor
não só a reparação por danos morais e patrimoniais mas, também, a efetiva prevenção
do dano.
Em igual
sentido, prescreve o art. 20, § 2º, do CDC citado, o que é serviço impróprio,
destacando a norma consumerista:
Art. 20 - O fornecedor de serviços responde
pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam
o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações
constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir,
alternativamente e à sua escolha:
Omissis- ...
§ 2º - São impróprios os serviços que se
mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como
aqueles que não atendam às normas regulamentares de prestabilidade.
É cediço que as práticas
abusivas constantes no CDC não são numerus
clausus, consistindo num elenco exemplificativo de prática comercias
abusivas, devendo o intérprete verificar o desequilíbrio, a manifesta vantagem
excessiva e a ofensa à boa-fé como fonte para a declaração da abusividade,
sendo indispensável cotejar com a teoria da lesão, buscando, assim, a
decretação da abusividade na relação de consumo.
A submissão à
espera na fila por tempo considerável, muito superior aos 15 (quinze) minutos
previstos em lei, em dias normais, causa inequivocamente aos consumidores um
significativo desequilíbrio físico e emocional, impondo aos usuários dos
serviços bancários, desconforto, prejuízo e indignação.
As agências
bancárias, assim, devem implementar um mecanismo eficaz de controle de
atendimento, para que não exponha o consumidor a constrangimento físico,
buscando, assim, a qualidade do serviço prestado ao usuário.
Acrescente-se,
ainda, que o consumidor possui a boa-fé objetiva, quem deverá fazer a prova de
que o consumidor está de má-fé é o fornecedor. E por fim, ocorrido o
constrangimento para o consumidor, restou demonstrado o dano moral.
Destarte,
constranger o consumidor, através de horas e horas em filas intermináveis, é
prática abusiva, que viola frontalmente os dispositivos que protegem o
consumidor em geral.
DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
Inicialmente, impende
destacar que a concessão de antecipação dos efeitos da tutela, antes da
resposta da parte processual ré, não ofende qualquer norma ou princípio
constitucional, valendo transcrever a doutrina de Nelson Nery Júnior, no
sentido de inexistência de violação ao princípio do contraditório nestes casos,
in verbis:
"Há,
contudo, limitação imanente à bilateralidade da audiência no processo civil,
quando a natureza e a finalidade do provimento jurisdicional almejado ensejarem
a necessidade de concessão de medida liminar, inaudita altera pars, como é o caso da antecipação de tutela de
mérito (CPC, art. 273), do provimento cautelar ou das liminares em ação
possessória, mandado de segurança, ação popular, ação coletiva (art. 81,
parágrafo único do CDC) e ação civil pública. Isto não quer significar,
entretanto, violação do princípio constitucional, porquanto a parte terá
oportunidade de ser ouvida, intervindo posteriormente no processo, inclusive
com direito a recurso contra a medida liminar concedida sem sua participação.
Aliás, a própria provisoriedade dessas medidas indica a possibilidade de sua
modificação posterior, por interferência da manifestação da parte contrária,
por exemplo." (Grifos nossos. In Princípios do Processo Civil na
Constituição Federal. Coleção de Estudos de Processo ENRICO TULLIO LIEBMAN –
volume 21.Editora Revista dos Tribunais, 5ª edição, 1999, página 141).
No que concerne
ao fumus boni iuris, emerge inquestionável, conforme exaustivamente exposto
acima, que as requeridas estão obrigadas a adotar as medidas determinadas,
tanto pela Lei municipal nº 2260/99, como pelo Código de Defesa do Consumidor,
todas normas em pleno vigor, mas flagrantemente descumpridas pelas agências
bancárias locais.
Por outro lado,
referido descumprimento é fato notório que independe de prova (art. 334, I
CPC), pois seu conhecimento integra o comumente sabido, ao menos em determinado
estrato social, por parcela da população a que interesse' (STJ-3a Turma, REsp
7.555 – SP, DJU 3.6.91, P. 7425). Logo, está preenchido o requisito da
verossimilhança da alegação (art. 273, CPC).
Outrossim, todos
os dias centenas de usuários acorrem às agências das instituições requeridas
que, por não contarem com instalações que satisfaçam aos ditames legais,
impõem-lhes sacrifícios físicos e morais. Por outro lado, usuários não clientes
das agências bancárias são, a todo o momento, possíveis vítimas de
discriminação em relação a clientes, quanto ao pagamento de contas até a data
do respectivo vencimento. Salta aos olhos, por isso, que a tutela deve ser
antecipada porque há fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação.
Não há,
finalmente, perigo de irreversibilidade do provimento antecipado, pois, se, por
hipótese improvável, viesse a ser revogado, as instituições requeridas teriam
como facilmente restabelecer o modo de prestação dos serviços bancários hoje
vigentes, embora indignos e intoleráveis para a população.
DO PEDIDO
Desta forma, requer seja
deferida a antecipação da tutela, obrigando as requeridas a colocar à
disposição de seus clientes senhas, com horário de entrada e o horário da
efetiva prestação de serviço, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, sob pena de
pagamento de multa diária no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), caso
o prazo transcorra sem a adoção das providências determinadas, requerendo,
ainda, que as requeridas:
No mesmo prazo,
criem um mecanismo eficaz de controle de atendimento, no prazo máximo de 15
(quinze) minutos, conforme determina a Lei, para que não exponha o consumidor a
constrangimento físico, buscando, assim, a qualidade do serviço, principalmente
sem a discriminação entre clientes e não clientes.
Informem a seus
usuários, através de cartazes, afixados na entrada das agências, a escala de
trabalho do setor de caixas colocados à disposição.
Finalmente,
pugna-se pela total procedência da presente ação, confirmando a antecipação de
tutela porventura deferida, condenando-se as requeridas ao pagamento do dano
moral coletivo, das custas, e demais cominações de estilo.
Requer, também,
a citação das requeridas para, querendo, contestarem a presente, sob pena de
revelia, sendo presumidos como verdadeiros os fatos ora deduzidos.
No caso de
condenação em dinheiro, por dano moral coletivo, postula-se seja o montante
revertido para o fundo de que dispõe o art. 13 da LACP.
Protesta pela
produção por todas as provas em direito admitidas, especialmente documental e
pericial, com determinação de realização de diligências nas agências, com
elaboração de laudo, no que pertine ao tempo de demora no atendimento dos
usuários, solicitando, ainda:
A publicação de edital, nos
termos da legislação vigente;
A inversão do ônus da prova,
de acordo com o disposto no artigo 6º do CDC;
A dispensa do pagamento de
custas e emolumentos, nos termos do artigo 18 da LACP.
Dá-se a causa, para fins
fiscais, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).
Termos em que,
Pede
deferimento.
Quirinópolis, 07 de janeiro
de 2014.
Angela Acosta Giovanini de
Moura
-promotora de justiça-